ECONOMIA DO COMPARTILHAMENTO: EFETIVIDADE DO DIREITO E (IN)SEGURANÇA
Marcelo Augusto Santana de Melo
Doutor e Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUCSP. Oficial de Registro Imobiliário, Títulos e Documentos e Pessoas Jurídicas em Araçatuba – SP.
Izaías Gomes Ferro Júnior
Doutorando em Função Social do Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo – FADISP. Mestre pela Escola Paulista de Direito – EPD. Oficial de Registro Imobiliário, Títulos e Documentos, Pessoas Jurídicas e Civil das Pessoas Naturais em Pirapozinho/SP. Autor e coordenador de artigos em Revistas Jurídicas.
Submissão: 01/12/2022
Aprovado em: 16/01/2023 e 05/04/2023
RESUMO: Este artigo efetuou uma leitura inicial, tendo como base o livro de Tom Slee, “Uberização”, explorando-se aspectos sociais e jurídicos sobre a economia do compartilhamento. Objetivou analisar e responder se a economia compartilhada se sustenta – ou sustentará – social e economicamente e quem pode tirar proveito econômico dela. A pesquisa baseou-se na doutrina dominante, em especial no tema “uberização”, do livro de Tom Slee, e utiliza o método dedutivo, ou seja, uma abordagem na qual se parte de premissas gerais (nesse caso, a doutrina dominante) para chegar a estabelecer especificamente a solução ao problema social analisado. Buscou identificar as bases econômicas, sociais e jurídicas a respeito dos efeitos das plataformas multilaterais de compartilhamento econômico de bens, e seus efeitos. Deu-se ênfase a noções de compartilhamento, desde a Pré-História até os tempos atuais, com a appficação das plataformas das empresas que tratam do tema central a partir da dinâmica desses agentes econômicos, os quais, não obstante o pouco tempo de existência, vêm causando grandes transformações na economia brasileira. Concluiu-se que se encontrou uma nova versão de capitalismo, extremo, onde grandes investidores encontraram um nicho de mercado para lucrar mais.
Palavras-chave: uberização, economia compartilhada, appficação, mudanças econômicas, capitalismo.
ABSTRACT: This paper performs an initial reading, based on Tom Slee’s book, “Uberização”, analyzing social and legal aspects of the Sharing Economy. It aims to analyze and answer whether the sharing economy is sustained or will be sustained socially and economically and who can take advantage of it. The research was based on the dominant doctrine, in particular the theme “uberization“ of Tom Slee’s book, using the deductive method, that is, an approach in which one starts from general premises (in this case, the dominant doctrine) to arrive at establishing specifically the solution to the analyzed social problem.It seeks to identify the economic, social and legal bases regarding the effects of multilateral platforms for economic sharing of goods, and their effects. Emphasis will be given to notions of sharing, from prehistory to current times, with the application of the platforms of companies that deal with the central theme from the dynamics of these economic agents who, despite their short existence, have been causing major changes in the Brazilian economy. It was concluded that a new version of capitalism was found, extreme, where big investors found a market niche to profit more.
Keywords: uberization, shared economy, appfication, economic changes, capitalism.
Introdução
A economia globalizada atualmente sofre grandes transformações culturais e socioeconômicas. Toda evolução (ou involução) social traz novos atores e debates sobre o momento pelo qual determinada sociedade passa. Os movimentos impulsionados por novas tendências e valores são, ora uma evolução contínua e constante, ora disruptivos1. Quando abruptos, ou rompedores, dão origem a fissuras sistêmicas no ordenamento econômico-sociojurídico. Os reflexos disruptivos do atual momento econômico, com a chamada “nova economia”, envolvendo o compartilhamento de bens, serviços etc., têm dado origem a novos comportamentos socioeconômicos, exemplificados com os novos serviços appficados do chamado capitalismo digital ou “de plataforma”.
Antes, porém, tem-se que a origem desse momento disruptivo foi uma reação à economia tradicional norte-americana, ocasionada pela crise dos subprimes2, iniciada nos Estados Unidos da América em meados de 2007, que desencadeou o começo da recessão mundial em 2008. Essa catástrofe minou a segurança econômica para muitos países, trazendo em seu rastro níveis alarmantes de desemprego e subemprego – especialmente para os jovens – junto com reduções na riqueza e aumento do medo e insegurança econômicos (LIMA; DEUS, 2013). Nesse compasso, a economia norte-americana entrou em profunda recessão em 2009. Ocorreu que, naquela época, a implantação de ativos não utilizados para ganho econômico ganhou apelo adicional e surgiram mecanismos para oferecer utilidade à capacidade ociosa dos ativos imobilizados com o emprego das hipotecas sem lastro econômico-financeiro.
Com a falência do regime dos subprimes, natural que a sociedade por conta própria, em caso da não ocorrência de modificação legislativa, faça movimento visando a sua própria proteção financeira. Aquela crise trouxe ensinamentos sobre a (in)segurança jurídica que se vive com a crescente virtualização de ativos e, principalmente, direitos imobiliários em diversos países com modelo deficiente de controle das garantias imobiliárias3.
Nesse mesmo período, iniciou-se uma onda crescente sobre uma “nova economia”, como foi chamada à época, que se concentrava em visões de resiliência e sustentabilidade, nas quais comunidades mais fracas, ou setores, como os consumidores conectados à internet, tornavam-se o tecido social para uma economia minimamente equilibrada com as empresas tradicionais já existentes no mercado, gerando a chamada economia do “novo mercado”.
As iniciativas desse novo modelo econômico são orientadas para alta satisfação, resultados igualitários, visando a também atingir níveis aprimorados de aprendizagem. O consumo conectado, ou consumo colaborativo, é baseado em uma cultura de acesso, uso e recirculação de bens como alternativas aos bens tradicionais, sejam eles móveis, imóveis ou direitos (VERDANA; BREI, 2016), o que levou a um novo termo: “economia do compartilhamento”4. Esta tem o potencial de transformar a mobilidade, as compras, as viagens, as práticas de trabalho, as condições de vida, a prestação de serviços, a produção doméstica, a aprendizagem entre outros. A prática do consumo conectado revela-se além de mera economia do compartilhamento, entretanto, esse aspecto não será tratado neste artigo.
Explorar o significado sociológico do consumo conectado à internet, focalizando especificamente as variáveis que medem o engajamento, a experiência e a eficácia, seria, há um quarto de século, chamado de utopia. Hoje, porém, uma realidade, pois se baseia em novas representações sociais, corriqueiras e já imperceptíveis à sociedade em geral. As representações sociais são produzidas em uma sociedade pelas suas relações jurídicas “espaço-tempo”. Engana-se quem acha que consegue prever como uma pessoa pode vir a comportar-se diante de uma situação específica e peculiar pois, a quase infalibilidade dos algoritmos5 (ILUMEO, [2020?]) é sempre questionada. É preciso entender as relações sociais presentes em determinado cotidiano, ou melhor, em seu microuniverso, e isso não tem como ser previsto.
Um grupo de pessoas tem reações diferentes, mesmo se inseridas em um mesmo espaço territorial e temporal, e submetidas a um mesmo fato. Comportar-se-ão de uma forma ou de outra diante de uma mesma situação peculiar, pois têm percepções diferentes. O que para alguns é aceitável, corriqueiro, para outros é exatamente o oposto. Pode ser inicialmente atraente, pode deixar de sê-lo num momento seguinte. Nesse ponto reside a transformação das ações, atitudes e aceitação, ou não, para a chamada “economia do compartilhamento”. Há fluidez nas atitudes sociais como nunca vista antes, levando à fulminação de alguns tradicionais setores da economia. Compartilhar é desejável para uns, inaceitável para outros, mas certamente o movimento social tende à crescente utilização desse “modelo de consumo”.
O chamado “compartilhamento” não é algo novo na história. Por certo, esse não é o único movimento social ou econômico em voga atualmente, mas este artigo será restrito ao compartilhamento de bens e serviços e suas nuances.6
Pois bem, o primeiro capítulo traz uma breve introdução histórica sobre o compartilhamento, seguido por outros aspectos propedêuticos sobre uma formação da teoria do compartilhamento no capítulo segundo, o qual se divide em três subtópicos: análise sobre a estrutura e a função da economia compartilhada, o compartilhamento de bens e serviços, e como Emile Durkheim iniciou estudos a respeito no final do século XIX. O terceiro capítulo faz críticas à atual modelagem do compartilhamento, abordando, em seus subtópicos, os aplicativos de transporte e termina com mais críticas ao modelo de compartilhamento atual.
Objetivou-se discutir, neste estudo, se de fato pode-se falar no surgimento de uma “nova economia do compartilhamento” viabilizada pelo desenvolvimento tecnológico de aplicativos de internet e seus benefícios (ou não), ou se as mudanças que se verificam nada mais são que adaptações do modelo de transporte, locação de bens, produtos ou serviços já existentes com uma nova roupagem adaptada a uma nova realidade. A pesquisa baseou-se na doutrina dominante, em especial no tema “uberização” do livro de Tom Slee (2017), utilizando-se o método dedutivo, ou seja, uma abordagem na qual se parte de premissas gerais (nesse caso, a doutrina dominante) para chegar a estabelecer especificamente a solução ao problema social.
1. Do compartilhamento na idade pré-histórica à formação da propriedade privada
A civilização, como a conhecemos hoje, é uma evolução lenta e gradativa, dos hominídeos desde a Pré-História até os dias atuais. O objetivo deste artigo não é verificar a questão da evolução (ou involução) científica dos primatas, e sim do compartilhamento de bens e serviços, em rápida passagem histórica.
O homem surgiu no planeta Terra há, aproximadamente, 4 milhões de anos. Há 2,4 milhões de anos, o Homo habilis teria saído da África em direção ao Cáucaso e estabelecido, nessa linha temporal, uma nova espécie, a Homo sapiens, a qual se espalhou por toda Europa e os demais continentes (FOLHA DE SÃO PAULO, 2019). O Homo sapiens tinha necessidade de adaptação por simples sobrevivência e naturalmente procurou adaptar-se ao ambiente e percebeu que agrupar-se com outros da mesma espécie era vantajoso, pois aumentava sua possibilidade de sobrevivência.
O objetivo desse agrupamento era unir esforços para a pesca, para a caça de animais de pequeno e médio porte, para o extrativismo vegetal e para compartilhar experiências. A questão da sobrevivência levou o homem a estocar algum alimento para eventual período de escassez. Naturalmente, em um primeiro momento da Pré-História7, todos os utensílios eram compartilhados no agrupamento social, pois não havia noção de propriedade de objetos ou de algum tipo de exclusividade, e sim de bens comuns para a sobrevivência. A necessidade fez o homem pré-histórico compartilhar tudo para sobreviver.
Alguns povos, em momento posterior, ou seja, na Idade Antiga, ainda não conheciam o direito de propriedade privada. Outros povos somente a compreendiam sobre os rebanhos, sobre as armas, jamais sobre a terra. O professor Caio Mário da Silva Pereira, em introito à Sociologia da Propriedade, perpassa sobre a ideia da propriedade antiga e afirma que ainda hoje alguns povos não subordinam o seu regime de bens à ideia de apropriação individual, o que certamente reflete no seu direito, desarticulado da concepção tão arraigada na consciência coletiva ocidental, que é o direito subjetivo, e assim deduz: “Está neste caso, por exemplo, o povo chinês, para o qual não foi o regime de Mao Tsé-tung que aboliu a propriedade privada, mas a sua tradição histórica” (PEREIRA, 2014, p. 3-4) – pelo menos até a alteração do regime político daquele país para o Capitalismo de Estado.
A propriedade privada é um fenômeno histórico que se desenvolveu com a necessidade de sobrevivência de um grupo contra outro que provavelmente, o atacava para obter seus produtos e gêneros alimentícios estocados. Portanto, um grupo de pessoas precisaria possuir, ao menos, os objetos e alimentos essenciais à sua sobrevivência e defendê-los. A coletividade antiga fez-se “proprietária”, então, de seus bens de utilidade como forma inicial de subsistência e sobrevivência.
Da necessidade de subsistência decorre a acumulação de bens de utilidade e gêneros alimentícios visando a épocas de escassez alimentar. Provavelmente, foi a relação estoque/necessidade no tempo que gerou situação de descontrole sobre o ponto de equilíbrio para tal finalidade. O acúmulo, inicialmente de alimentos, passa a ser sobre o local de cultivo, com a mitigação da situação de nomadismo social dos povos pré-históricos. A transposição da necessidade de estoque de sustento à “propriedade da terra”8, ou no mínimo posse, e mesmo à acumulação de bens e serviços, numa espécie de mero consumo ou uso funcional para a “propriedade” acumulativa, só pode ocorrer no âmbito de uma comunidade razoavelmente organizada jurídica e politicamente. O conceito jurídico de propriedade é, portanto, o conceito da propriedade instituída. A partir da instituição da “propriedade” e sua individualização, perde-se a noção de compartilhamento dos bens e serviços da sociedade pré-histórica.9
Faz-se necessário, neste ponto do trabalho, definir, de forma sucinta o que seria compartilhar antes de se verificar uma teoria sobre o objeto deste estudo.
2. Aspectos propedêuticos de uma pretensa “Teoria do Compartilhamento”
A princípio há que se entender o significado do termo “compartilhar”. Numa primeira acepção, tem como sinônimo linguístico, mas vulgar, a ideia de fazer parte de algo com alguém, dividir alguma coisa. Entretanto, pode ser visto também como o ato de repartir, compartir, rachar, subdividir, distribuir, ratear, participar, coparticipar, comungar, associar-se, aquinhoar.
Dentre esses termos, o que interessa inicialmente ao presente artigo é a ideia do compartilhamento econômico, ou seja, sua ideia vulgar. Tal ideia é a corrente, pois os crescentes estudos sobre o compartilhamento são feitos rotineiramente sobre os transportes, com o uso de plataformas de aplicativos para locomoção urbana, cujo exemplo mais comum é a Uber; e, para os bens imóveis de locação temporária, o Airbnb, entre outros sobre os quais se discorrerá ao longo do artigo, contudo, esses são, geralmente, os primeiros exemplos de que o leitor se recordaria sobre o tema “Economia do Compartilhamento”.
Entretanto, o compartilhamento vai além do termo econômico, como o de bens e serviços. Não se pode deixar de pontuar a ideia do compartilhamento do sentimento, tema corriqueiro e muito estudado no Direito da Família, mas que não é o objetivo deste artigo10. Efetivamente, o compartilhamento de bens e serviços tem, no mínimo, um viés econômico, seja pela sua natureza de “troca” ou mesmo pela natureza de prestação de serviço.
Uma expressão anglófona bastante comum sobre o tema é “what’s mine is yours”, que em tradução livre para o português seria “o que é meu é seu”. As sociedades latinas também encampam a ideia de generosidade no compartilhamento, a exemplo da frase mi casa, su casa.
Ao se verificar a evolução da cultura, para não dizer “economia”, da sociedade pré-histórica para os dias atuais, Rachel Botsman e Roo Rogers (2010b) classificaram-na como Lifestyle colaboration11, ou seja, compartilhamento de recursos, tais como materiais e meios de produção e tempo12,13. O tempo, em primeira análise, pode ser mensurável economicamente14 no contexto da economia do compartilhamento.
Trazendo a questão do compartilhamento para uma realidade próxima à brasileira, interessante é a ideia, ou melhor, a falta de noção de propriedade de alguns povos originários, noção essa substituída pelo princípio do compartilhamento, onde não era considerada transgressão a subtração de objetos pertencentes a outrem, mas, sim, deixar de repartir uma caça15. Os índios não conheciam propriedade privada imóvel nos moldes estabelecidos hodiernamente: “[…] a terra era bem comunal. Tudo quanto se plantava e colhia, mesmo caça e pesca, distribuía-se entre todos” (CASCUDO, 1998).
Como anteriormente dito, embora o compartilhamento seja uma forma de permuta que perdura desde a Pré-História, a necessidade atual, pós-recessão global de 2009, fez, e ainda faz, surgir novos formatos. Muito diferente do compartilhamento entre familiares, vizinhos e amigos, o atual modelo, da década de 2010 em diante, é uma forma de mercado em que estranhos trocam bens e serviços, para os quais foram criadas diferentes maneiras de fornecimento e oportunidades para o que se pode chamar de “consumo conectado”. Esse consumo é feito por plataformas de aplicativos (appficação) de internet, contando com relacionamentos entre pares em vez de atores de mercado existentes para mediar as trocas.
A economia compartilhada inicia-se motivada por preocupações econômicas, pretensamente ecológicas, bem como pelo desejo de aumentar as conexões sociais e o networking16 entre as pessoas, para atingir satisfação com menor custo e maximizar o seu tempo ou o lucro17. A questão que surge desses objetivos iniciais é estabelecer se a eficácia da economia compartilhada tem cumprido tais metas.
2.1 Análise sobre a estrutura e a função da economia compartilhada
Todo direito pode ser visto pelo prisma de sua estrutura ou de sua função. Pietro Perlingieri perguntaria sobre esse novel direito: “o ‘como é?’ evidenciando a estrutura, e ‘para que serve?’ evidenciando sua função” (PERLINGIERI, 1997, p. 94). O que seria então esse direito de compartilhamento? Compartilhar o quê? Compartilhar serviço? Propriedade? O que pode ser compartilhado? Entre as funções do direito, há uma série delas que seriam relevantes para o compartilhamento, como a regulação social, a sociologia, a limitação ao poder político, a relação entre direito e violência, o poder, a ideologia e a racionalidade jurídica (ABBOUD; CARNIO; OLIVEIRA, 2020). Neste artigo será analisado apenas a função regulatória e social do compartilhamento.
2.1.1 Análise propedêutica sobre o compartilhamento da propriedade
Inicialmente, analisando-se a propriedade e seu conteúdo estrutural conforme o direito brasileiro, ela é composta pelas faculdades de usar, gozar, dispor e reivindicar a coisa. Esses elementos compõem a estrutura do direito de compartilhar uma propriedade, mas não retratam ainda sua função. O elemento estrutural do direito à propriedade encontra o seu núcleo central no exercício de um poder pelo seu titular, que gera a sujeição de terceiros a esse assenhoreamento que tem sobre a coisa.
Para não estender em demasia o artigo, os demais compartilhamentos poderão ser realizados em um estudo mais aprofundado em futuras publicações, mas, a título de exemplificação, pode-se compartilhar bens móveis e imóveis, sendo eles: a) bens móveis: uso de ferramentas, veículos terrestres, aquáticos e aéreos; b) bens imóveis: b.1 condomínio comum, geral ou ordinário (art. 1.314 do Código Civil); b.2 condomínio edilício (art. 1.331 do Código Civil e Lei nº 4.591/1964); b.3 multipropriedade – Time Sharing (Lei nº 13.465/2017 e Código Civil); b.4 direito de laje (Lei nº 13.465/2017) (BRASIL, 1964; 2002; 2017a).
Igualmente, pode-se compartilhar direitos: a) ações; b) criptomoedas; c) ônus; d) direitos reais de garantia (alienação fiduciária em garantia – MP nº 992/202018 e Lei nº 9.514/1997); e) Fundo Garantidor Solidário – Lei nº 13.986/2020 (BRASIL, 1997; 2020a; 2020b). Pode-se compartilhar os sistemas de produção imaterial: a) propriedade intelectual e industrial. b) “software livre”; c) produção científica industrial. Esse rol, dentro dos bens, é apenas exemplificativo para dar noção do que é possível ser compartilhado, fugindo ao clássico compartilhamento de locação de veículos e imóveis.
A partir da construção jurídica do Direito Civil ao longo do século XX, incorporam-se gradativamente as finalidades, os motivos e as razões para o uso social da propriedade (DEBONI, 2010). “Para que serve?” é a questão clássica formulada por Perlingieri (1997). Qual é a função da propriedade? Classicamente, usar, gozar, dispor e reivindicar. Para o direito atual, agrega-se naturalmente a função social ao elemento estrutural do direito de propriedade. Trouxe consigo, portanto, a finalidade principal à propriedade do século XXI.
O Ministro Luís Edson Fachin recorda que impor uma função – no caso social – importa em determinar uma direção (FACHIN, 2000, p. 209). Portanto, a função social da propriedade é dotada da capacidade de alterar a estrutura tradicional (usar, gozar, fruir e reivindicar), inserindo-se em seu perfil interno.19 Nota-se que não há antagonismo entre propriedade privada (estrutura) e função social (para que serve). Importante perceber como a função social integra a estrutura do direito de propriedade, uma vez que os elementos estruturais e funcionais compõem o todo, ou seja, o direito visto exogenamente.
Retornando ao tema “compartilhamento”, há os que, de forma entusiástica, defendam a nova economia e aleguem que as novas plataformas (ou mesmo tecnologias) renderão resultados no mínimo mais satisfatórios que os da velha economia, visto que, de início, empoderam pessoas comuns, libertam-nas de horários rígidos e supostamente aumentam a eficiência de seu trabalho (SLEE, 2017). Entretanto, os críticos tradicionais da nova economia as denunciam como uma nova “espécie de escravidão”, a exemplo do sociólogo Ricardo Antunes, professor livre-docente da Unicamp (SUGIMOTO, 2018)20. A nova economia seria voltada ao mero interesse econômico, e não ao compartilhamento. Finalisticamente teria caráter exploratório de mão de obra.
2.2 Compartilhamento de bens e serviços
O compartilhamento dos bens e serviços, ao longo da história, altera-se com o fato social a cada situação de um povo em seu tempo e espaço, nas lições do professor Oliveiros Litrento, citado por Airton Rodrigues Moreira (2022), em adição ao fato, valor e norma insculpidos na tradicional Teoria Tridimensional do Direito, do professor Miguel Reale (GONZAGA; ROQUE, 2017). Para o professor Litrento (1984, p. 6): “O sistema de valores socialmente vigente comanda nossa estrutura mental e moral”. Em sintética análise do pensamento dele, a norma jurídica regula um fato considerado inadequado para que fique em harmonia com os valores sociais vigentes em um dado tempo de uma sociedade de um determinado local. O Direito, como fenômeno social, tem realidade que se desenvolve, portanto, através do espaço e do tempo. Logo, se deduz que os valores, fatos e normas não são estanques, haja vista que a sociedade impinge novos valores a todo instante, quer os suprimindo, alterando ou constituindo em determinado tempo21.
A solidariedade do período pré-industrial, pautada nas tradições, dá lugar à solidariedade orgânica, moderna, baseada na interdependência entre os indivíduos com foco na produção e acumulação de bens. Nessas sociedades modernas (europeias), há uma mudança relevante no modo de produção, a qual complexifica a sociedade, estabelece uma nova divisão social do trabalho, intensifica o processo de urbanização e faz com que a moral e as tradições percam sua força como fator de coesão social. Assim, a sociedade enfraquece as estruturas que orientam as ações dos indivíduos, mitigando situações que já eram precariamente normatizadas. Essa “ausência de regras” cria um estado anômico, segundo o filósofo francês Emile Durkheim (DURKHEIM, 1982), em que os sujeitos deixam de ter a sociedade como referência e agem baseados em seus interesses, anomicamente.22 Nesse período histórico a individualização dos meios de produção e acumulação de bens é levada ao extremo, e não se percebe algum tipo de compartilhamento econômico.
2.3 Émile Durkheim e a análise do comportamento coletivo no final do século XIX
David Émile Dukheim, em seu livro “Da Divisão do Trabalho Social”, estuda a evolução da solidariedade (THOMPSON, 2002). Nas palavras de Abboud, Carnio e Oliveira (2020, p. 155-156), o filósofo
[...] se dedicou a estabelecer a sociologia como disciplina rigorosamente objetiva, opondo-se a todas as orientações que transformavam a investigação social numa dedução de fatos particulares a partir de leis supostamente universais, como a lei dos três estados de Comte. A crítica de Durkheim é que uma lei desse tipo pode até ter alguma utilidade para a filosofia da história, mas não tem serventia maior para o estudo dos fatos sociais concretos.
Para o filósofo, a solidariedade das sociedades tradicionais passadas era baseada na solidariedade mecânica, que era fundamentada no comportamento coletivo e em atividades de produção, pouco mais ou pouco menos diferenciadas. O aspecto social estudado por Durkheim sobre a solidariedade foi baseado na proximidade, na similaridade e no compartilhamento de histórias e valores comuns às comunidades humanas. Segundo o autor, essa solidariedade deu lugar a uma solidariedade orgânica, prevalecente na sociedade moderna do fim do século XIX23 (época em que viveu o autor) (DURKHEIM, 1982).
Esse modelo de solidariedade deu as primeiras mostras com a divisão do trabalho e as suas consequências, tais como a alta densidade populacional e o avanço da tecnologia. De acordo com Durkheim, essa divisão social do trabalho pareceu criar uma relação de interdependência, uma função social, entre os seres humanos (DURKHEIM, 1982). Em momentos disruptivos e de transformação social, o papel moderador e disciplinador social é suspenso, criando um ambiente sem regras (anômico). Esse estado de anomia é caracterizado pela falta de disciplina e de regras que orientam a sociedade24. Assim, como efeito, observa-se uma desarmonia entre os sujeitos e a sociedade.
Dos estudos de Durkheim à segunda década do século XXI, há uma alteração cíclico-temporal sobre o que se entenderia como “solidarismo social”, desaguando no que se chamaria atualmente de “compartilhamento”.
Atualmente, o que se entende por compartilhar é um comportamento fundamental do consumidor que tende a ser ignorado ou confundido com troca de mercadorias e oferta de presentes. Os termos “presentear”, “compartilhar” e “trocar” mercadorias são imprecisos. O compartilhamento é um tópico de pesquisa do consumidor distinto, antigo e cada vez mais vital que envolve uma ampla gama de questões de consumo, que vão desde o compartilhamento de recursos domésticos até a atomização de posses familiares para compartilhamento de arquivos versus direitos de propriedade intelectual. A revisão teórica distingue entre compartilhar e o que e como compartilhar, e sugere que esse ato dissolve as fronteiras interpessoais impostas pelo materialismo e pelo apego à posse por meio da expansão do self agregado. No entanto, tal compartilhamento é desafiado pela crescente “comoditização” do mercado. Hoje não há como dissociar a sociedade de consumo como parte desse sistema e devem ser consideradas implicações para a teoria e a pesquisa do consumidor nessa “nova economia”, sem se esquecer do anteriormente dito sobre como é improvável saber de antemão seu comportamento, mesmo em face de pretensas vantagens que o compartilhamento possa trazer.
Estabelecidos esses parâmetros iniciais, passa-se a analisar aspectos positivos e negativos da atual modelagem do compartilhamento.
3. Críticas à atual modelagem de compartilhamento
Neste tópico, faz-se necessário estabelecer alguns parâmetros diferenciadores sobre a modelagem da economia do compartilhamento. Em primeiro lugar, não se deve misturar compartilhamento de recursos (transporte como aluguéis de bicicletas, veículos, passeios, apartamentos etc.) com compartilhamento de trabalho, do conhecimento e, por fim, do tempo. O primeiro traz nitidamente a ideia de explorar ao máximo os recursos existentes e, essencialmente, reduzir o desperdício; enquanto o segundo é sobre como minar os empregos existentes com uma concorrência possivelmente desleal, que se pode levar ao subemprego ou mesmo a uma “escravidão moderna”.
Os negócios na economia compartilhada, como Uber e Airbnb, operam em uma área jurídica cinzenta simplesmente porque a lei ainda está aprendendo como essas empresas funcionam. A nova economia impõe desafios às leis de locação de habitação temporária (hotéis, motéis, locação para temporadas e, por que não, locação com extensão de tempo de um ano?) e de trânsito, o que resulta em ações trabalhistas, seja no Brasil ou em outros países. Além dos aspectos jurídicos insipientes, há preocupações com o intermediário, ou seja, as plataformas de uso de aplicativos para os mais diversos fins, pois as empresas não estariam oferecendo segurança ao motorista, ao anfitrião e ao consumidor, gerando lucros sem responsabilidades e poderes públicos interferindo nessas relações.25
Tom Slee (2017) retoma o debate ao dizer que a retórica de “compartilhar” é ridícula quando o dinheiro troca de mãos e o intermediário leva sua “comissão”26. É praticamente o mesmo modelo do Mercado Livre, forte na América Latina, e do eBay no mundo, mas esses não propagandeiam retórica exagerada do compartilhamento. Administrar uma empresa com fins lucrativos faz parte do capitalismo há séculos e não compreende noção econômica com “má reputação” nem de forma altruísta (CAPLAN, 2014). Como Adam Smith apontou, “seu padeiro não assa seu pão por motivos altruístas, mas ele ainda faz bem”, contribui para a sociedade com um bem de consumo (WEINSTEIN, [1995?]).27
A internet é campo fértil para o capitalismo de risco florescer. Há ganhadores e perdedores quando se joga com o capital. O benefício do capital de risco28 tornou esses empreendedores de internet “visionários” depois do fato social estabelecido, como explicado anteriormente. Além disso, parece haver uma “pandemia” que os desenvolvedores de softwares usam para anexar a palavra “disrupção” a tudo, quando, na verdade, muito poucas startups, e mesmo empresas estabelecidas, têm inovações verdadeiramente inovadoras.
3.1 Aplicativos de transporte e compartilhamento
O licenciamento de táxis nas cidades brasileiras não beneficia, geralmente, os motoristas que trabalham duro, mas sim empresas de táxi ou detentores de alvarás. Os trabalhadores nesse setor alugam os veículos dos operadores e pagam aluguéis para tal, minimizando seus ganhos.
Um sistema muito melhor seria a criação de uma prova de aptidão, teórica e prática, com publicação de edital prévio, informando requisitos objetivos, além da obrigatoriedade de veículo próprio para obtenção do alvará junto à municipalidade, que não pudesse ser cedido, alienado ou, por qualquer outra forma, utilizado por outro motorista senão pelo próprio detentor do alvará. Deveria ser criado algum tipo de fundo de pensão e plano médico a ser pago à municipalidade ou a outro órgão definido por lei, para, baseado nas horas reais trabalhadas, ratear a participação do motorista.
A empresa Uber é um caso interessante. Foi rotulada como uma das primeiras empresas globais nos transportes ditos “compartilhados”, levando à produção de estudos mais aprofundados a respeito do modelo de compartilhamento. Seria uma solução para o problema dos transportes individuais que eram quase privativos dos táxis no mundo e no Brasil29? Efetivamente, a Uber e outras empresas – como a Lyft, nos Estados Unidos – estão atingindo o público consumidor que se utiliza dos táxis.
Entretanto, no modelo de “compartilhamento”, um intermediário que recebe uma parte para manter sua plataforma eletrônica obterá lucro. Essa ideia de lucro para o intermediário é normal no mercado, a exemplo dos corretores de imóveis, operadores da bolsa de valores etc. A ideia de compartilhamento faz pouco sentido quando cobram taxas ou percentuais abusivos, mas a questão de limites para tais é mercadológica. Se há um público que consome esse produto, seria abusivo? Quando há falta de emprego, as pessoas que se propõem a serem motoristas desses aplicativos aceitam qualquer proposta, haja vista que não estão ganhando qualquer renda.
Tom Slee (2017) desmonta a fachada da economia compartilhada, revelando verdades ocultas e muitas vezes preocupantes sobre empresas como Uber e Airbnb, como a mudança da generosidade, que vai de “o que é meu é seu” para “o que é seu é meu” – título em inglês de seu livro “What is your is mine”, traduzido para “Uberização”, em português. Questiona-se a possibilidade de compartilhamento da riqueza e não apenas o enriquecimento de plataformas de compartilhamento, seus diretores e investidores.
3.2 Modelo de compartilhamento e outras críticas
Tom Slee analisa essa situação e faz profundas críticas ao modelo romântico do compartilhamento:
Meu impulso central para escrever este livro foi um sentimento de traição: o que havia começado como um apelo à comunidade, às conexões interpessoais, à sustentabilidade e ao compartilhamento, tornou-se o playground de bilionários, de Wall Street e de capitalistas de risco, que cada vez mais expandem seus valores de livre mercado sobre nossas vidas. A promessa de um caminho humano para o mundo corporativo é, ao contrário do que possa parecer, uma forma mais agressiva de capitalismo, com desregulação, novas formas de consumismo e uma nova onda de trabalho precarizado. (SLEE, 2017, p. 297).
Hoje há uma proliferação generalizada de sites que comercializam o compartilhamento de carros/viagens. Isso parece apenas expor indivíduos gananciosos por trás desses sítios de internet. O que se espera deles é exatamente encontrar alguém que ofereça o que preciso, ou seja, um telefone ou WhatsApp para me conectar com pessoas que possam me oferecer uma carona para o mesmo destino ao qual estou precisando chegar. Dividiria custo com quem me oferece carona. Isso é compartilhar! Já as plataformas oferecem uma rede de pessoas que estão dispostas a me locomoverem até onde preciso por um custo, digamos, “um pouco maior”. Nada de errado nisso, pois, afinal, não conto o custo de manutenção de seu veículo, riscos no trânsito e outros problemas que possam ocorrer. Entretanto, a realidade é que plataformas tecnológicas globais fazem a intermediação, cobrando percentuais significativos dos que se sujeitam a operar nesse sistema tido inicialmente como “solidário”. Via de regra, ambos ficam satisfeitos, quem presta o serviço é remunerado, bem como quem se utiliza desse sistema de plataforma em aplicativo. Ninguém se negaria a pagar uma taxa mínima pelo custo de hospedagem, de transporte.
Entretanto, o romantismo inicial de solidariedade e de compartilhamento ao dar caronas – o que não se faria de forma voluntária – não é mais o mesmo que compartilhar viagens, mas mero serviço de transporte pago, ou seja, um serviço de táxi. A empresa Uber é apenas outra maneira com que uma empresa de táxi encontra pessoas necessitadas de locomoção, ou seja, de buscar clientes. Não tem nada a ver com compartilhamento, é uma transação comercial regular para um serviço executado.
O compartilhamento de recursos não utilizados é uma coisa completamente diferente. Pagam-se impostos? Há regulamentação fiscal às locações do tipo Airbnb? O próprio site do Airbnb fala em pagamento de alguns impostos30. Complexa a tarefa, pois há impostos locais que entre as milhões de cidades de seus clientes, o controle certamente seria deficitário. Igualmente com a Uber. Pagou imposto, segundo várias informações da internet, mas seria confiável tal informação? (FUTEMA, 2018). Os seus motoristas pagam tributos? O que se faz hoje não é compartilhar, e sim são maneiras alternativas de obter lucro pagando menos impostos. NÃO compartilham o lucro.
Todas as plataformas de aplicativos pedem que as partes se autoavaliem, e não se pode deixar acreditar que esse processo todo não envolva, em mensagem subliminar, um estrito controle. A confiança, a solidariedade de outrora dará lugar a uma vigilância generalizada31 .
4. Considerações finais
Ao longo do texto, percebeu-se que o tema leva o leitor a ter mais questionamentos que respostas. A leitura atenta do livro de Tom Slee, “Uberização”, trouxe reflexões antes não percebidas por quem, através do marketing das empresas de compartilhamento, expõe apenas benefícios. Claro que o tema é complexo e não há condições de olhar apenas pelo prisma midiático-empresarial da Economia do Compartilhamento.
Questiona-se, portanto, se há sustentabilidade social, econômica e política na economia compartilhada. A sustentabilidade pressupõe a articulação de diversas áreas, como a econômica, a social, a cultural-científica, a educacional, para melhorias simultâneas, ou seja, equilíbrio na distribuição da renda, no padrão de qualidade das populações, no acesso igualitário aos direitos políticos, civis, aos serviços públicos que garantam preservação de condições para o crescimento da sociedade, e não apenas uma casta privilegiada, econômica ou politicamente.
Os fatores econômicos, com o crescimento da nova economia (Economia do Compartilhamento), são disruptivos em relação ao status quo ante, em que a população mundial, de forma geral, está linearmente inserida.
Não se pode dizer que os movimentos econômicos foram sempre imperceptíveis ao longo dos séculos, pois vez ou outra ocorrem saltos em determinados campos da ciência, a exemplo das descobertas das ciências naturais, da política etc. O mesmo ocorre com novos modelos econômicos, como Thomas Friedman afirmou, e que poderia ser entendido como um novo termo “lavagem do compartilhamento”, na qual plataformas transferem o risco para os funcionários sob o pretexto do “compartilhamento”. Tom Slee desafiou as alegações do Airbnb, segundo as quais seus usuários são indivíduos ganhando pequenas quantidades de renda extra, descobrindo que metade da renda gerada na cidade de Nova York advém de anfitriões com mais de um imóvel listado. O tema central das críticas é que as plataformas com fins lucrativos capturaram o que começou como uma ideia progressiva e socialmente transformadora.
Os capítulos deste artigo foram dispostos de forma que o leitor perceba que o compartilhamento não é situação nova e, em algum momento, desvirtuou-se para que os investidores das empresas do ramo ganhassem cada vez mais.
Não há romantismo, ou, pelo menos, aquele inicial, e sim um modelo capitalista extremo, em que os grandes investidores querem cada vez mais obter lucros dentro desse mercado, esquecendo-se que quem trabalha é o cidadão que foi enebriado com a figura de ser um empresário, uma pessoa que faz seu horário, não tem patrão. Estaria errado o cidadão ao investir e obter lucros? Estaria errado o cidadão que pretende trabalhar conforme lhe é conveniente?
REFERÊNCIAS
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1 Os momentos disruptivos clássicos descritos na história são a Revolução Agrícola, a Revolução Industrial, e a Revolução Tecnológica, focada na inovação, conhecida como Era da Informação (GRAGLIA, 2018).
2 A origem do termo subprime baseia-se no excesso de crédito a tomadores que não apresentavam garantias reais, ou elas já eram insuficientes para novos empréstimos. Nos EUA os registros são simples agências que recolhem as declarações que são, na quase totalidade, preenchidas em formulários na internet e sufragam os dados em seus sistemas sem que haja uma prévia qualificação jurídica do título em seus vários aspectos. Não há controle dos títulos contraditórios, como no Brasil, a exemplo de penhoras, indisponibilidades, bloqueio de matrículas referente a determinados imóveis, nem uma qualificação subjetiva, ou seja, sobre a titularidade daquele direito real. Alia-se ao fato que, nos Estados Unidos da América, um tipo de fraude é comumente encontrada com a aplicação do golpe denominado identity theft mortgage, ou seja, roubo da identidade para hipotecar bem imóvel, ou como a população de lá se refere: “roubo de casas”. Isso alcançou níveis alarmantes e exigiu a atuação do FBI – Federal Bureau of Investigation, que cuidou de divulgar em seu site um alerta, fornecendo indicações de como o negócio funciona – e muito bem - naquele país, acautelando e informando os cidadãos norte-americanos. Os fraudadores apresentam-se como possíveis compradores, ou como simples corretores imobiliários, e perguntam sobre o imóvel, obtendo os dados pessoais dos proprietários. O que demonstra a insegurança sistêmica até hoje encontrada nos países com sistema ineficiente de registro imobiliário, nas palavras de Fernando Méndez Gonzáles (MÉNDEZ GONZÁLES, 2012).
3 Vale registrar que a crise do subprime levou os norte-americanos a questionarem seu atual sistema de registro de imóveis.
4 O termo “Economia do Compartilhamento” não é unânime. Há quem chame de Economia dos Bicos (gig economy), Economia da Viração, Consumo Colaborativo entre outros.
5 Algoritmo é um conjunto de instruções ou sequência de passos para você atingir um objetivo. Em uma rede social, por exemplo, é a estratégia de análise de dados para aprender e classificar qual o seu perfil. O algoritmo emprega técnicas de levantamento de dados e formas de processá-los (OLIVEIRA, 2020).
6 Os mais conhecidos movimentos sociais são o trabalhista, o ambiental, o político, o racial, o de gênero, o de publicidade, entre outros. Ou seja, qualquer grupo de pessoas que defenda, lute e corrobore para uma causa é considerado um movimento social, por se manifestarem através de suas pautas. Porém, os movimentos sociais podem ser caracterizados de maneiras diferentes: i) movimento de transformação: é criado para modificar algum aspecto político ou social através de reivindicações; ii) movimento de conservação: surge para manter algum aspecto político ou social; iii) movimentos tradicionais: ocorridos principalmente no século XIX, após a Revolução Industrial, têm temas voltados para classes sociais, com uma grande luta entre o proletariado e a burguesia; iv) movimentos novos: são aqueles que têm em sua luta questões de classe, porém sua maior pauta é de cunho identitário, ou seja, são minorias que pedem representatividade e voz dentro da sociedade; v) movimento conjuntural: é aquele que aparece em uma conjuntura, que se organiza e se estrutura de acordo com uma demanda instantânea, em uma situação específica; vi) movimento estrutural: é aquele que tem demandas e objetivos que serão conquistados em longo prazo, ou seja, demanda uma alteração completa na estrutura social, um exemplo de movimento estrutural é o movimento negro, contra o racismo (SIGNIFICADOS, [2021?]).
7 A Pré-História é definida como o ciclo anterior ao surgimento da escrita pelos povos sumérios, por volta de 3.500 a.C. Após esta data, a idade histórica comumente aceita nos meios acadêmicos é dita como Idade Antiga.
8 O termo “propriedade”, como a conhecemos hoje, não tem correspondência na Pré-História, visto que a posse plena seria a mais aceita.
9 Com a revolução verde, que ocorre na época do Neolítico, inicia-se o surgimento da propriedade privada, a diferenciação entre os sexos e a divisão social. “[...] cria-se uma divisão do trabalho cada vez mais nítida entre homem e mulher e um domínio sobre a mulher por parte do homem [...]” A revolução neolítica é também uma revolução educativa: fixa uma divisão educativa paralela à divisão do trabalho (entre homem e mulher, entre especialistas do sagrado e da defesa e grupos de produtores); fixa o papel-chave da família na reprodução das infraestruturas culturais: papel sexual, papéis sociais, competências elementares, introjeção da autoridade; produz o incremento dos locais de aprendizagem e de adestramento específicos (nas diversas oficinas artesanais ou algo semelhante; nos campos; no adestramento; nos rituais; na arte) (SÓ PEDAGOGIA, [entre 2008 e 2023]).
10 O compartilhamento do afeto, em linhas gerais, pode ser classificado em: guarda compartilhada de filhos; compartilhamento parental de crianças e idosos; e guarda compartilhada de idosos.
11 Em estilos de vida colaborativos (tradução livre), pessoas com necessidades ou interesses semelhantes se unem para compartilhar e trocar ativos menos tangíveis, como tempo, espaço, habilidades e dinheiro. Essas trocas acontecem principalmente em nível local ou de bairro, pois as pessoas compartilham espaços de trabalho (por exemplo, no Citizen Space ou Hub Culture), jardins (no SharedEarth ou Landshare) ou vagas de estacionamento (no ParkatmyHouse). O compartilhamento colaborativo do estilo de vida também acontece em uma escala global, por meio de atividades como empréstimos ponto a ponto (em plataformas como Zopa e Lending Club) e as viagens ponto a ponto em rápido crescimento (no Airbnb e Roomorama) (BOTSMAN; ROGERS, 2010b).
12 Segundo Botsman e Rogers o modelo econômico da chamada Economia do Compartilhamento contempla três tipos de sistemas: 1) mercados de redistribuição: ocorre quando um item usado passa de um local onde ele não é mais necessário para onde ele seja, baseia-se no princípio do “reduza, reuse, recicle, repare e redistribua”; 2) lifestyles colaborativos: baseia-se no compartilhamento de recursos, tais como dinheiro, habilidades e tempo; 3) sistemas de produtos e serviços: ocorre quando o consumidor paga pelo benefício do produto e não pelo produto em si. Tem como base o princípio de que aquilo que precisamos não é um CD, e, sim, a música que toca nele, o que precisamos é um buraco na parede e não uma furadeira, e se aplica a praticamente qualquer bem (BOTSMAN; ROGERS, 2010b).
13 Botsman e Rogers dividem consumo colaborativo em três sistemas: os sistemas de serviços de produtos (SSP), os mercados de redistribuição e os estilos de vida colaborativos (BOTSMAN; ROGERS, 2010a).
14 Instituir um banco de tempo, quer entre pessoas físicas, ou físicas e jurídicas, ou mesmo apenas entre pessoas jurídicas, revela outra situação de compartilhamento. Serviços poderiam ser trocados por unidades de tempo, como uma hora de prestação de um serviço de contabilidade por um conserto de determinada situação doméstica, por exemplo.
15 “Relatos de pessoas Kaingang mais velhas dão conta que, mesmo a caça não podia ser apropriada (consumida) pelo homem que a caçou, devendo ser repartida entre seus parentes (VEIGA, 2006).
16 Networking é uma forma de trabalhar a rede de contatos de alguém, trocando informações relevantes com base na colaboração e ajuda mútua, normalmente objetivando vender algo, apresentar alguma coisa, colaborar com determinada situação para mútuo benefício, entre outras razões.
17 A ideia de troca de tempo ou banco de tempo surge em meados de 1980 como uma alternativa para pequenas comunidades ajudarem os grupos marginalizados, sendo também uma opção para os momentos de crise. Organizações “offline” foram criadas para reunir pessoas a fim de trocar bens e serviços por meio de uma moeda fictícia, que só pode ser utilizada dentro da comunidade. Os bancos de tempo, então, reconhecem as pessoas como ativos, promovendo igualdade, aumentando a força de comunidades com colaboração entre jovens, adultos e idosos e, como consequência, diminuindo a competição apresentada pelo mercado de trabalho convencional. Um dos principais valores dessas comunidades é a reciprocidade. O fundador da Time Bank (banco de tempo), Edgar Cahn, acredita que esse valor é o que dá mais sentido à vida das pessoas que participam e garante um aumento de confiança entre os seus membros (COSTA; FALCÃO, 2018).
18 A MP nº 992/2020 não foi convertida em lei.
19 A Constituição Federal, ao dispor sobre o direito de propriedade, insere a sua disciplina no rol dos direitos fundamentais, conforme art. 5º, XXII. Entretanto, não esquece de vetorizar sua função, ou seja, o inciso XXIII explicita o exercício de sua função social (BRASIL, 1988).
20 “Um imperativo anterior aos capitais, observa Antunes, era a terceirização-meio, a pretexto de deixar as atividades menos importantes para terceiros, ficando para as empresas as atividades fins. ‘Uma mentira, porque depois de conseguirem a terceirização-meio, agora impõem a terceirização total. Já pude afirmar que a terceirização total é uma espécie de volta da escravidão. Alguém vai questionar: como assim, escravo? É que a nossa fala é metafórica: na escravidão, o proprietário de terras comprava o escravo; na terceirização, o empresário aluga os trabalhadores – é sutil a diferença, mas o significado é o mesmo”. Antunes, em seu livro “Adeus ao trabalho?”, de 1995, já falava que a tendência para o mercado de trabalho era a terceirização sem limites e que os trabalhadores se tornariam algo como “escravos do século XXI” (SUGIMOTO, 2018).
21 O objetivo deste artigo não é discutir “tempo” de forma científica, mas sim uma linha contínua e linear da forma leiga para um jurista.
22 A anomia é um conceito desenvolvido pelo sociólogo francês Émile Durkheim para explicar a forma com a qual a sociedade cria momentos de interrupção das regras que regem os indivíduos. O termo deriva da palavra grega nomos, que significa “norma”, “regra”, precedida pelo prefixo de negação a- (“não”). O conceito de anomia foi, na Sociologia, cunhado por Émile Durkheim nas obras: “Elementos de Sociologia” (1889); “Da Divisão Social do Trabalho” (1893); “As Regras do Método Sociológico” (1895); o “Suicídio” (1897); “As Formas Elementares da Vida Religiosa” (1912). Apesar de seu falecimento em 1917, ainda foram publicadas as obras póstumas: “Educação e Sociologia” (1922); “Sociologia e Filosofia” (1924); e “O Socialismo” (1928). Na obra “A Educação Moral” (1925), abordou-se o papel da moral no combate ao estado anômico. Para esse sociólogo, a anomia é uma situação social que surge por conta do enfraquecimento dos vínculos sociais e pela perda da capacidade da sociedade de regular o comportamento dos indivíduos, gerando, por exemplo, fenômenos sociais como o suicídio. Trata-se de uma ausência de um “corpo de normas sociais” capaz de regular o convívio marcado pela “solidariedade”. Para Durkheim, a anomia é uma etapa temporária, produto das rápidas transformações sociais, perda da fé (em seu sentido mais amplo) e das tradições. Essa etapa, para ele, é superada a partir do momento que grupos de interesses determinam novas regras a fim de regulamentar o que se encontra “desajustado” na sociedade, assim como afirmar novas tradições ou refortalecer as já estabelecidas. Nesse sentido, anomia seria um mal crônico das sociedades modernas, marcada pelas rápidas transformações, as quais levam a situações de desajustes sociais causados pela crise (ou ausência) de uma forte “consciência coletiva”. No contexto de uma situação anômica, os limites sociais se encontram frágeis ou não existem, não estando claro o que é justo ou injusto, legítimo ou ilegítimo; perde, assim, os indivíduos, as referências sociais. Essa situação gera um sentimento de frustração e mal-estar, parecendo que não existem normas e impera o “tudo pode” (BODART, 2015).
23 Durkheim, em estudo sobre a solidariedade, definiu-a pela interdependência e a complementaridade impostas pela sociedade moderna para os seres humanos, onde cada membro da sociedade, enquanto ser independente e único, está ligado aos demais numa estrutura de solidariedade complementar. Os fatos sociais que a Ciência da Sociologia estuda são as ações coletivas já instituídas e cristalizadas em normas e, quase sempre, tornadas regulares. Durkheim deduz que a vida social também tem suas correntes e está sempre em transformação. Expressamente conclui que o funcionamento de sociedades mais avançadas só pode ser compreendido quando somos informados sobre a organização de sociedades menos desenvolvidas (DURKHEIM, 1982).
24 Esse estado pode causar uma série de patologias sociais (dentre elas, o suicídio) estudadas por Durkheim. Em sua obra “O Suicídio” (publicada em 1897), Durkheim afirma que existem três tipos fundamentais de suicídio: o suicídio egoísta, que ocorre quando a pessoa se isola do meio social por não compartilhar dos princípios que o regem; o suicídio altruísta, que ocorre quando o indivíduo é absorvido por uma causa, e sua vida passa a representar um valor menor que a coletividade; e o suicídio anômico, que é um efeito das transformações sociais, que colocam os indivíduos em apartados da coletividade, desregulados e em desarmonia com a sociedade (DURKHEIM, 1982).
25 O plenário do STF, em 8 de maio de 2019, decidiu que são inconstitucionais leis que restringem ou proíbem a atividade de transporte individual de passageiros por meio de aplicativos, como Uber, Cabify e 99. Por unanimidade, os ministros entenderam que a restrição dessas atividades viola os princípios da livre iniciativa e da livre concorrência. Assim, fixaram as seguintes teses: “A proibição ou restrição do transporte individual por motorista cadastrado em aplicativo é inconstitucional em razão da violação aos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência. No exercício de sua competência para a regulamentação e fiscalização no transporte privado individual de passageiros, os municípios e os distritos federais não podem contrariar os parâmetros fixados pelo legislador Federal.” A decisão foi tomada em duas ações: no RE 1.054.110 e na ADPF 449. Na ADPF, ajuizada pelo PSL, o objeto de questionamento era a Lei nº 10.553/2016 de Fortaleza, que proibia o uso de carros particulares, cadastrados ou não em aplicativos, para o transporte remunerado individual de pessoas. Lei declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, após julgamento procedente da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 449/DF (FORTALEZA, 2016; BRASIL, 2017b; 2019).
26 Em sua pesquisa, Tom Slee, na prática, foca em tecnologias digitais.
27 Adam Smith: “Again, there are philosophical issues here. First, is what one is to regard as labor; second is what counts towards economic value. Additionally, Smith is showing how the division of labor works on a large scale; it is not just for pin factories. Rather, different populations can be dedicated to different tasks for everyone’s benefit. (This might be an anticipation of David Ricardo’s notion of “comparative advantage.”) A commercial system is an integrated one and the invisible hand ensures that what benefits one group can also benefit another. Again, the butcher, brewer, and baker gain their livelihood by manufacturing the lunch of their customers. (WN I.ii.2)” (WEINSTEIN, [1995?]).
28 Eles são atraídos pela possibilidade de um cenário em que o vencedor leva tudo, que é tão típico no mundo do software e dos modernos aplicativos. São riscos sujeitos a ganhos e perdas.
29 O desenho regulatório criado para o transporte individual na década de 1960 manteve-se praticamente inalterado no Brasil desde então em termos estruturais (autoridade competente, controle de entrada e tarifário), com enfoque nos serviços de táxi. Existe um número limitado de alvarás que são emitidos pelo poder público. Motoristas que desejam oferecer o serviço de transporte de táxi (transporte individual público e serviço de interesse público local) devem obter tal alvará a partir de um procedimento altamente burocratizado. Nesse sentido, a indústria de táxi configurou-se no Brasil como um mercado fechado, no qual a regulação se caracteriza, em primeiro plano, “pelas barreiras à entrada e saída do mercado e pela política tarifária”. Na legislação e na literatura, o táxi foi caracterizado como uma das espécies de transporte público. A Lei Federal nº 9.503/1997 (Código de Trânsito Brasileiro) também definiu que “os veículos de aluguel, destinados ao transporte individual ou coletivo de passageiros de linhas regulares ou empregados em qualquer serviço remunerado, para registro, licenciamento e respectivo emplacamento de característica comercial, deverão estar devidamente autorizados pelo poder público concedente” (BRASIL, 1997, art. 135) – reforçando o controle estatal sobre essa atividade. Durante o governo Dilma, duas mudanças importantes aconteceram com relação à regulação do transporte individual. A primeira foi a introdução da “lei dos taxistas” (Lei Federal nº 12.468/2011), que regulamenta a profissão de taxistas. Tal legislação definiu que “é atividade privativa dos profissionais taxistas a utilização de veículo automotor, próprio ou de terceiros, para o transporte público individual remunerado de passageiros” (BRASIL, 2011, art. 2º). A segunda mudança foi a criação da Lei Federal nº 12.587/2012, que instituiu as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana. Essa norma definiu o transporte público individual como “serviço remunerado de transporte de passageiros aberto ao público, por intermédio de veículos de aluguel, para a realização de viagens individualizadas” e o transporte motorizado privado como “meio motorizado de transporte de passageiros utilizada para a realização de viagens individualizadas por intermédios de veículos particulares” (BRASIL, 2012, art. 4º). (ZANATTA; PAULA; KIRA, 2017).
30 Disponível em: https://www.airbnb.com.br/help/article/318/como-funciona-a-tributa%C3%A7%C3%A3o-para-os-h%C3%B3spedes. Acesso em: 2 abr. 2023.
31 Disponível em: https://www.spiegel.de/wirtschaft/airbnb-und-Uber -was-steckt-hinter-der-sharing-economy-a-1083971.html. Acesso em: 02 abr 2023.